quinta-feira, 10 de abril de 2008

Para matar um grande amor



( Texto extraído do jornal Gazeta do Povo – Curitiba/Paraná – datado ed 09/07/2000) Jamil Snege

Muito se louvor a arte do encontro, mas poucos louvaram a arte do adeus. No entanto não há gesto profundamente humano quanto uma despedida. É aquele momento em que renunciamos não apenas à pessoa amada, mas a nós mesmos, ao mundo, ao universo inteiro.

O amor relatizava renúncia absoluta. E não há sentimento mais absoluto do que a solidão em que somos lançados após o derradeiro abraço, o último desesperado entrelaçar de mãos. Arrisco mesmo a dizer só os verdadeiros amores se acabam.

Os que sobrevivem incrustados no hábito de se amar, podem durar uma vida inteira e podem até ser chamados de amor mas nunca foram ou serão um amor verdadeiro. Falta-lhes exatamente o Dom da finitude, abrupta e intempestiva. Qualidade só encontrável nos amores que infundem medo e temor de destruição.

Não se vive o amor, sofre-se o amor. Sofre-se a ansiedade de não poder retê-lo, porque nossas cordas afetivas são muito frágeis pra mantê-lo retido e domesticado como um animal de estimação. Ele é xucro e bravio e nos despedaça a cada embate e por fim se extingue e nos extingue com ele.

Aponta numa única direção : o rompimento. Pois só conseguiremos suportá-lo se ocultarmos de nossos sentidos o objeto dessa desvairada paixão. Mas não se pense que esse é um gesto de covardia. O grande amor exige isso. O rompimento é sua parte complementar. Uma maneira astuciosa de suspender a tragédia,ditada pelo instinto de sobrevivência de cada um dos amantes.

Morrer um pouco para se continuar vivendo. E poder usufruir daquele momento mágico, embebido de ternura, em que a voz falseia, as mãos se abandonam e cada qual vê o outro se afastar como se através de uma cortina líquida ou de um vitral .

Há todo um imaginário sobre os adeuses e as separações, construído pela literatura e pelo cinema. O cenário pode ser uma estação de trem, um aeroporto (remember Casablanca), um entroncamento rodoviário. Pode ser uma praça ou uma praia deserta. Falésias ou ruínas de uma cidade perdida.

Pode estar garoando ou nevando, mas vento é imprescindível. As nuvens devem revolutear no horizonte, como a sugerir a volubilidade do destino. Os cabelos da amada, longos e escuros, fustigam de leve seus lábios entreabertos.

Há sutis crispações, um discreto arfar de seios. E os olhos, ah!, os olhos...A visão é o último e o mais frágil dos sentidos que ainda nos une ao que acabamos de perder. Uma grande dor, uma solidão cósmica, um imenso sentimento de desterro. Que se curam algum tempo depois com um amor vulgar, desses feitos para durar a vida inteira....


Um comentário:

Ocenilda disse...

Amiga,

Como disse no texto anterior, o verdadeiro amor nunca acaba, por isso nao acredito que possa existir uma "receita milagre" para se matar um grande amor. Isso, nao seria verdadeiro, seria tentar enganar aos outros, mas principalmente, a si mesmo. O verdadeiro amor deixa lembranças gostosas que alimentam o restante dos nossos dias, como um bom filme que, volta e meia, reprisa na nossa mente. Se tentassemos matar esse lindo sentimento que é o verdadeiro amor e que poucos sao os privilegiados que o sentem realmente, tornar-nos-iamos seres vazios e frustrados. O que é bom e que nos fez ou faz feliz nunca deve ser eliminado.

Beijos no seu coraçao.

Ocenilda